Catálogo da BE

segunda-feira, 21 de junho de 2010

Cerimónia de homenagem ao escritor


Cinzas de Saramago vão ficar em Lisboa


As cinzas do corpo de José Saramago vão ficar em Lisboa. A confirmação chegou durante o discurso do presidente da câmara municipal, António Costa, na cerimónia de homenagem ao escritor que decorreu no Salão Nobre dos Paços do Concelho, onde estiveram presentes a família, amigos e algumas das principais personalidades dos mundos da cultura e política nacionais.


Até à hora da saída do caixão com o corpo do escritor do Salão Nobre da câmara de Lisboa, prevista para as 12h, houve lugar aos discursos do presidente da autarquia, António Costa, do representante da Fundação José Saramago, Carlos Reis, do líder do PCP, Jerónimo de Sousa, da vice-presidente do Governo espanhol, María Teresa Fernández de la Vega, e da ministra da Cultura, Gabriela Canavilhas.

Presentes na cerimónia estiveram o primeiro-ministro, José Sócrates, os ex-presidentes da República Ramalho Eanes e Mário Soares, que ontem chegou a defender que as cinzas de Saramago fossem depositadas no Panteão Nacional, o antigo líder do PCP Carlos Carvalhas, o vice-presidente da Assembleia da República Guilherme Silva, o secretário-geral do PSD, Miguel Relvas, o presidente do Tribunal de Contas, Guilherme d’Oliveira Martins, em representação do presidente da Assembleia da República, a ministra da Educação, Isabel Alçada, o ministro da Ciência, Mariano Gago, o ensaísta Eduardo Lourenço, o, poeta Nuno Júdice, e o editor Zeferino Coelho, entre outros.

António Costa abriu a cerimónia com um curto discurso de agradecimento a Saramago pelo seu contributo à cidade de Lisboa e à cultura do país. “Saramago regressa à cidade onde trabalhou, onde escreveu, onde presidiu à assembleia municipal de Lisboa e onde criou a fundação a que deu o seu nome e que ficará instalada, como era seu desejo, na Casa dos Bicos”. “Lisboa foi um dos personagens a que dedicou mais amor em toda a sua obra”, sublinhou, acrescentando que “as cinzas de José Saramago descansarão na cidade de Lisboa, mas a sua obra é uma obra que é património de toda a humanidade e a sua mensagem, o seu desassossego, continuarão a desinquietar-nos e a desinquietar todos aqueles que lerem a sua obra”. “Obrigado, José Saramago”, terminou o presidente da Câmara Municipal de Lisboa.

Também o líder do PCP deixou algumas palavras de homenagem a Saramago e expressou, em nome de “muitos milhares de camaradas” de partido, um “sentimento de perda” pela morte do “camarada José Saramago”. “Deixou-nos de luto, a nós e ao povo português, em particular ao povo trabalhador, de onde veio, a quem amou e foi fiel”, disse. “Usando e desenvolvendo a sua obra para fazer humanos todos os sentidos do homem, pela sua vida perpassa o ideal de um protagonista de Abril, que encontrou no seu partido, no Partido Comunista Português, que quis ser seu até ao fim da sua vida, um ideal mais avançado”, acrescentou.

Perto de 300 pessoas assistiram à cerimónia de homenagem a Saramago através de um ecrã gigante colocado na Praça do Município, onde acompanharam os discursos proferidos no interior do Salão Nobre.

"Saramago fez soar as cordas da alma"

No seu discurso, a vice-presidente do Governo espanhol, María Teresa Fernández de la Vega, proferiu uma das frases mais emotivas dos discursos de homenagem ao Nobel da Literatura: "Saramago fez soar as cordas da alma".

“Todos nos sentimos órfãos da sua figura tão querida e das suas palavras tão confortantes, órfãos de quem tantas vezes foi a nossa voz, a voz mais humana e mais digna”, disse a responsável. María Teresa de la Vega descreveu Saramago como “uma dessas poucas pessoas que sabem recordar-nos que podemos e devemos ter grandes sonhos, tão grandes que nunca os percamos de vista”.

“E ele sonhou. Sonhou com uma terra livre - livre de opressão, de miséria e de perseguição. Sonhou com um mundo em que os fortes eram mais justos e os justos eram mais fortes - um pouco mais fortes a cada dia”, acrescentou. “E ofereceu-nos os seus sonhos em páginas cheias de ideias, ilusões de vida, que passaram a fazer parte dos nossos tesouros mais queridos, que nos demonstraram que a vida dos livros, quando são escritos com a pureza com que o fazia José Saramago, pode ser tão intensa como a real”, prosseguiu.

No final do seu discurso, a vice-presidente do Governo espanhol declarou: “Nunca esqueceremos o escritor, o esposo, querida Pilar, o intelectual, o companheiro e amigo. A sua memória é parte da nossa memória, porque a sua vida é uma parte muito querida da nossa vida”.

Seguiu-se a ministra da Cultura, Gabriela Canavilhas, que lembrou que Saramago “não tinha fé em Deus, mas se Ele existe, certamente Deus teve fé nele”.

Perto do meio-dia, foram interpretadas duas peças clássicas pela violoncelista Irene Lima, que envergou um vestido comprido vermelho em organza que Pilar del Río usou em 1998 na entrega do Nobel da Literatura a Saramago, que na bainha tinha bordado um verso do escrito.

Durante os discursos, a mulher de Saramago, Pilar del Río, a filha do escritor Violante e os seus filhos, mostraram-se emocionados e agradecidos pelas palavras ditas em homenagem a Saramago.

Terminada a cerimónia, a maioria das personalidades presentes dirigiram-se a Pilar del Río para lhe prestar pessoalmente as suas condolências.

No exterior do edifício da autarquia, ouviram-se palmas quando Jerónimo de Sousa abandonou o Salão Nobre e se começaram os preparativos para retirar a urna com o corpo de Saramago e a transportar para a viatura que a levará até ao cemitério do Alto de São João, onde serão cremados os restos mortais do escritor.

O professor de matemática, Ricardo Dias, uma das pessoas presentes na Praça do Município, veio de bicicleta. Lamentou que a praça não estivesse toda cheia. "Saramago é uma referência nacional, na literatura, pelo prémio Nobel, pela sua obra”. Já a arquitecta Isabel Labaredas, esteve no velório ontem quando depositou uma rosa branca junto ao corpo do escritor e voltou hoje para acompanhar os discursos na Praça. “Admiro Saramago. Os livros dele". E concluiu: "Cada um tem sua relação com o escritor e se calhar a maior homenagem que podemos fazer é continuar a lê-lo".

Antes da saída do caixão, Pilar del Río, acompanhada por Violante, surgiu à varanda dos Paços do Concelho para se despedir e agradecer às pessoas que se encontravam na Praça do Município, recebendo de volta um forte aplauso.

Quando a urna foi colocada na viatura que a transportou até ao cemitério do Alto de São João, ouviram-se novos aplausos das personalidades da cultura e política e anónimos, entre a frase “Obrigado, Saramago”, gritada por muitos dos presentes.

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