Catálogo da BE

terça-feira, 22 de junho de 2010

Lei deixa que cinzas de Saramago fiquem num jardim público.


Ainda não está decidido o local, mas as cinzas de José Saramago devem ficar num jardim em Lisboa, debaixo de uma pedra, um lugar público onde as pessoas possam passar e deixar uma flor. Esta era a vontade do autor de "O Memorial de Convento". Pilar del Río, que está à frente da Fundação Saramago, está a dar seguimento ao desejo manifestado pelo marido.

Já foi estudada a regulamentação e é possível cumprir este desejo de José Saramago desde que esteja salvaguardada a inviolabilidade do local. A decisão só será anunciada publicamente quando tudo estiver pronto.
Ainda não está decidido qual será o local escolhido, mas várias hipóteses têm sido pensadas (entre elas o jardim do Alto de Santa Catarina ou o jardim em frente à Casa dos Bicos, que é a sede da Fundação José Saramago, ou qualquer sítio que remeta para a sua obra).
No Decreto-Lei n.º 411, de 1998, lê-se que "as cinzas resultantes da cremação podem (...) ser entregues dentro de recipiente apropriado a quem tiver requerido a cremação, sendo livre o seu destino final".
Ângelo Mesquita, director municipal do Ambiente Urbano, disse ao PÚBLICO que, "se as cinzas forem depositadas no espaço público, a Câmara Municipal de Lisboa tem de aprovar esse acto". No entanto, o director não vê que exista qualquer óbice a essa autorização.
Por sua vez, José Sá Fernandes, o vereador dos Espaços Verdes, questionado sobre se será num jardim ou noutro local, respondeu: "Não sei, o assunto ainda está a ser analisado." Durante os últimos dias tem-se especulado na comunicação social portuguesa e internacional se as cinzas ficariam em Portugal ou se em Portugal e em Espanha. Desde o dia da morte de José Saramago que o PÚBLICO tem noticiado que os restos mortais do Nobel ficariam em Portugal. Anteontem, durante o discurso que o presidente da Câmara de Lisboa, António Costa, fez na cerimónia de homenagem que decorreu no Salão Nobre dos Paços do Concelho, em Lisboa, disse peremptoriamente: "As cinzas de José Saramago descansarão na cidade de Lisboa."
A edição de ontem do jornal Diário de Notícias avançava com a notícia de que a vontade do escritor era que as suas cinzas ficassem num jardim, onde se colocaria uma pedra com o seu nome para que os leitores pudessem "lá ir pôr uma flor de vez em quando".
Não terá sido por acaso que José Saramago pensou num jardim. É uma decisão íntima, não se pode especular sobre ela e Pilar del Río ainda não veio a público explicar a decisão. O que é interessante nesta escolha é que o jardim é um espaço de regeneração. A especialista em jardins históricos Aurora Carapinha lembra que dentro da cidade o jardim é "o espaço de renovação". O jardim "é terra, é coisa natural" e "pode-se sempre renascer". Além de ser "um espaço onde as pessoas vão à procura de silêncio e de quietação." É um espaço de intimidade e ao mesmo tempo de sociabilidade (de desinquietação).


Saramago: Venda de livros aumenta quase dez vezes.



As vendas dos livros de José Saramago aumentaram quase dez vezes nos dias seguintes à morte do escritor, disseram hoje fontes de duas grandes cadeias de livrarias em Portugal.


Durante o fim-de-semana a Fnac teve um aumento de 800% na venda de livros do escritor, disse o director de marketing e comunicação da empresa, Viriato Filipe.


"Caim", "A Viagem do Elefante" e "Memorial do Convento" foram os títulos que registaram maior aumento de vendas, seguidos de outras obras, embora com aumentos de vendas menos significativos, acrescentou.


Já nas livrarias da Bertrand Editora, o aumento de vendas de livros de Saramago registado este fim-de-semana foi dez vezes superior ao ocorrido no fim-de-semana anterior à morte do escritor, disse a responsável de marketing da editora.


Marta Serra acrescentou que no fim-de-semana após a morte do escritor, as livrarias da Bertrand venderam 1 000 livros de Saramago contra os 100 do fim-de-semana anterior.


"Caim" (300 exemplares), "Memorial do Convento" (200 exemplares" e "A Viagem do Elefante" (150 exemplares) foram os títulos mais vendidos pela Bertrand após a morte do Nobel da Literatura.


Zeferino Coelho, responsável pela Editorial Caminho, editora de Saramago, corroborou o aumento da procura de obras do escritor nos dias seguintes ao seu falecimento.


Questionado sobre se a editora irá fazer reedições de obras do Nobel da Literatura, Zeferino Coelho disse que as obras de Saramago "se reimprimem constantemente".


"In Nomine Dei" e "Ensaio sobre a Cegueira" são títulos que a Editorial Caminho vai reimprimir de imediato, não porque sejam obras com aumento de procura, mas porque são títulos dos quais a editora tinha menores reservas em armazém, acrescentou Zeferino Coelho.


O responsável editorial da Caminho - editora do grupo LeYa - disse ainda que continuam a chegar à editora muitas mensagens de pesar pela morte de José Saramago.


"Como as pessoas não sabem para quem mandar as mensagens, acabam por fazê-lo para a editora", sublinhou.


José Saramago, 87 anos, morreu na sexta-feira ao início da tarde na sua residência em Tías, na ilha de Lanzarote (Canárias), após doença prolongada.

segunda-feira, 21 de junho de 2010

Várias centenas de pessoas no cemitério do Alto de São João



Várias centenas de pessoas estiveram esta tarde no cemitério do Alto de São João para a despedida a José Saramago. No último adeus ao escritor, a sua mulher, Pilar del Río, fez ainda um pequeno discurso dirigido à família antes da cremação do corpo de Saramago.


O caixão com o corpo de José Saramago deixou pelas 12h35 a Câmara Municipal de Lisboa com destino ao cemitério. Depois de uma emocionada cerimónia de homenagem ao escritor no Salão Nobre, a urna coberta com a bandeira nacional foi colocada na viatura que a transportou até àquele ao crematório de Lisboa.

No cemitério, o corredor que dá acesso ao local da cremação estava totalmente preenchido por personalidades e centenas de anónimos, que gritavam “Saramago: a luta continua” e “O povo está contigo, Saramago amigo”, enquanto alguns empunhavam livros do autor.

A eurodeputada Edite Estrela lembrou a dívida que tem a Saramago por ele “ ter sido um embaixador extraordinário da língua e cultura portuguesas”.

Pelas 13h10, a urna com o corpo do Prémio Nobel da Literatura entrou, carregada em ombros, no Alto de São João. Entre fortes aplausos, muitos dos presentes atiraram cravos vermelhos ao caixão.

A urna foi depois colocada na sala que dá acesso ao crematório, e aí, apenas na presença de familiares e de amigos mais próximos, a mulher do escritor, Pilar del Río, fez um pequeno discurso de despedida a Saramago. Nessas palavras, contou uma história que aconteceu com Jorge Amado, escritor brasileiro, e através dela lembrou Saramago. Procedeu-se depois à cremação dos restos mortais do escritor.

As pessoas que estiveram no Alto de São João abandonaram lentamente o cemitério, ficando apenas a famílias, amigos e jornalistas. Da família de Saramago, a filha, Violante, foi a última a sair.

As cinzas do escritor vão ficar em Lisboa, confirmou esta manhã, na cerimónia de homenagem ao escritor nos Paços do Concelho, o presidente da câmara municipal, António Costa. O local exacto onde serão depositadas é ainda desconhecido. Zeferino Coelho, editor de José Saramago, voltou hoje a afirmar que a decisão funeral caberá a Pilar.

As cinzas poderão ser entregues à família duas horas após a cremação, mas a Servilusa, empresa funerária, disse desconhecer os planos dos familiares do escritor.


Cerimónia de homenagem ao escritor


Cinzas de Saramago vão ficar em Lisboa


As cinzas do corpo de José Saramago vão ficar em Lisboa. A confirmação chegou durante o discurso do presidente da câmara municipal, António Costa, na cerimónia de homenagem ao escritor que decorreu no Salão Nobre dos Paços do Concelho, onde estiveram presentes a família, amigos e algumas das principais personalidades dos mundos da cultura e política nacionais.


Até à hora da saída do caixão com o corpo do escritor do Salão Nobre da câmara de Lisboa, prevista para as 12h, houve lugar aos discursos do presidente da autarquia, António Costa, do representante da Fundação José Saramago, Carlos Reis, do líder do PCP, Jerónimo de Sousa, da vice-presidente do Governo espanhol, María Teresa Fernández de la Vega, e da ministra da Cultura, Gabriela Canavilhas.

Presentes na cerimónia estiveram o primeiro-ministro, José Sócrates, os ex-presidentes da República Ramalho Eanes e Mário Soares, que ontem chegou a defender que as cinzas de Saramago fossem depositadas no Panteão Nacional, o antigo líder do PCP Carlos Carvalhas, o vice-presidente da Assembleia da República Guilherme Silva, o secretário-geral do PSD, Miguel Relvas, o presidente do Tribunal de Contas, Guilherme d’Oliveira Martins, em representação do presidente da Assembleia da República, a ministra da Educação, Isabel Alçada, o ministro da Ciência, Mariano Gago, o ensaísta Eduardo Lourenço, o, poeta Nuno Júdice, e o editor Zeferino Coelho, entre outros.

António Costa abriu a cerimónia com um curto discurso de agradecimento a Saramago pelo seu contributo à cidade de Lisboa e à cultura do país. “Saramago regressa à cidade onde trabalhou, onde escreveu, onde presidiu à assembleia municipal de Lisboa e onde criou a fundação a que deu o seu nome e que ficará instalada, como era seu desejo, na Casa dos Bicos”. “Lisboa foi um dos personagens a que dedicou mais amor em toda a sua obra”, sublinhou, acrescentando que “as cinzas de José Saramago descansarão na cidade de Lisboa, mas a sua obra é uma obra que é património de toda a humanidade e a sua mensagem, o seu desassossego, continuarão a desinquietar-nos e a desinquietar todos aqueles que lerem a sua obra”. “Obrigado, José Saramago”, terminou o presidente da Câmara Municipal de Lisboa.

Também o líder do PCP deixou algumas palavras de homenagem a Saramago e expressou, em nome de “muitos milhares de camaradas” de partido, um “sentimento de perda” pela morte do “camarada José Saramago”. “Deixou-nos de luto, a nós e ao povo português, em particular ao povo trabalhador, de onde veio, a quem amou e foi fiel”, disse. “Usando e desenvolvendo a sua obra para fazer humanos todos os sentidos do homem, pela sua vida perpassa o ideal de um protagonista de Abril, que encontrou no seu partido, no Partido Comunista Português, que quis ser seu até ao fim da sua vida, um ideal mais avançado”, acrescentou.

Perto de 300 pessoas assistiram à cerimónia de homenagem a Saramago através de um ecrã gigante colocado na Praça do Município, onde acompanharam os discursos proferidos no interior do Salão Nobre.

"Saramago fez soar as cordas da alma"

No seu discurso, a vice-presidente do Governo espanhol, María Teresa Fernández de la Vega, proferiu uma das frases mais emotivas dos discursos de homenagem ao Nobel da Literatura: "Saramago fez soar as cordas da alma".

“Todos nos sentimos órfãos da sua figura tão querida e das suas palavras tão confortantes, órfãos de quem tantas vezes foi a nossa voz, a voz mais humana e mais digna”, disse a responsável. María Teresa de la Vega descreveu Saramago como “uma dessas poucas pessoas que sabem recordar-nos que podemos e devemos ter grandes sonhos, tão grandes que nunca os percamos de vista”.

“E ele sonhou. Sonhou com uma terra livre - livre de opressão, de miséria e de perseguição. Sonhou com um mundo em que os fortes eram mais justos e os justos eram mais fortes - um pouco mais fortes a cada dia”, acrescentou. “E ofereceu-nos os seus sonhos em páginas cheias de ideias, ilusões de vida, que passaram a fazer parte dos nossos tesouros mais queridos, que nos demonstraram que a vida dos livros, quando são escritos com a pureza com que o fazia José Saramago, pode ser tão intensa como a real”, prosseguiu.

No final do seu discurso, a vice-presidente do Governo espanhol declarou: “Nunca esqueceremos o escritor, o esposo, querida Pilar, o intelectual, o companheiro e amigo. A sua memória é parte da nossa memória, porque a sua vida é uma parte muito querida da nossa vida”.

Seguiu-se a ministra da Cultura, Gabriela Canavilhas, que lembrou que Saramago “não tinha fé em Deus, mas se Ele existe, certamente Deus teve fé nele”.

Perto do meio-dia, foram interpretadas duas peças clássicas pela violoncelista Irene Lima, que envergou um vestido comprido vermelho em organza que Pilar del Río usou em 1998 na entrega do Nobel da Literatura a Saramago, que na bainha tinha bordado um verso do escrito.

Durante os discursos, a mulher de Saramago, Pilar del Río, a filha do escritor Violante e os seus filhos, mostraram-se emocionados e agradecidos pelas palavras ditas em homenagem a Saramago.

Terminada a cerimónia, a maioria das personalidades presentes dirigiram-se a Pilar del Río para lhe prestar pessoalmente as suas condolências.

No exterior do edifício da autarquia, ouviram-se palmas quando Jerónimo de Sousa abandonou o Salão Nobre e se começaram os preparativos para retirar a urna com o corpo de Saramago e a transportar para a viatura que a levará até ao cemitério do Alto de São João, onde serão cremados os restos mortais do escritor.

O professor de matemática, Ricardo Dias, uma das pessoas presentes na Praça do Município, veio de bicicleta. Lamentou que a praça não estivesse toda cheia. "Saramago é uma referência nacional, na literatura, pelo prémio Nobel, pela sua obra”. Já a arquitecta Isabel Labaredas, esteve no velório ontem quando depositou uma rosa branca junto ao corpo do escritor e voltou hoje para acompanhar os discursos na Praça. “Admiro Saramago. Os livros dele". E concluiu: "Cada um tem sua relação com o escritor e se calhar a maior homenagem que podemos fazer é continuar a lê-lo".

Antes da saída do caixão, Pilar del Río, acompanhada por Violante, surgiu à varanda dos Paços do Concelho para se despedir e agradecer às pessoas que se encontravam na Praça do Município, recebendo de volta um forte aplauso.

Quando a urna foi colocada na viatura que a transportou até ao cemitério do Alto de São João, ouviram-se novos aplausos das personalidades da cultura e política e anónimos, entre a frase “Obrigado, Saramago”, gritada por muitos dos presentes.

domingo, 20 de junho de 2010

Um adeus português ao escritor universal


José Saramago 1922-2010

Corpo do escritor chegou ontem a Portugal. Funeral é hoje, em Lisboa

Milhares de pessoas passaram ontem, desde o início da tarde, pelo Salão Nobre dos Paços do Concelho de Lisboa para uma derradeira homenagem ao escritor José Saramago, falecido anteontem, na ilha espanhola de Lanzarote. O funeral realiza-se hoje às 12 horas.
Anónimos e figuras públicas associaram-se à manifestação de pesar pelo desaparecimento físico do mais laureado escritor português contemporâneo. Primeiro, a conta-gotas e, ao fim de alguns minutos, com a chegada de um número crescente de pessoas, a fila não tardou a chegar à Praça do Município. A espera, essa, prolongou-se por longos minutos.
Além de familiares e amigos próximos, compareceram ao acto figuras das letras como Eduardo Lourenço, Manuel Gusmão e Gonçalo M. Tavares, mas também políticos de longa data (Jorge Sampaio, Diogo Freitas do Amaral e representantes dos principais partidos (como o primeiro-ministro, José Sócrates, Jerónimo Sousa e Francisco Louçã).
A ausência do presidente da República, Cavaco Silva, da cerimónia não passou despercebida aos presentes, mas, nas declarações aos jornalistas, ninguém criticou o chefe de Estado. Marcelo Rebelo de Sousa optou por desvalorizá-la, afirmando que "é mais importante a presença espiritual de Cavaco Silva do que a presença física", enquanto o antigo presidente da República Mário Soares observou que "a melhor homenagem é a que o povo português lhe está a prestar"
O cortejo fúnebre parte hoje, às 12 horas, rumo ao cemitério do Alto de S. João, em Lisboa onde será feita a cremação, conforme desejo expresso do autor de "Levantado do chão".
Vaticano critica escritor
O coro de homenagens ao escritor natural da Azinhaga percorreu Mundo, numa demonstração adicional do prestígio e da popularidade da sua obra, mas houve pelo menos uma excepção aos elogios rasgados: ontem mesmo, o diário oficial do Vaticano, "L'Osservatore Romano", publicou um violento artigo em que definia o escritor português como "populista e extremista" de uma ideologia antirreligiosa e marxista.
No texto, que reflecte a tensão existente há longos anos entre o romancista e os meios eclesiásticos, o articulista, Claudio Toscani, critica de forma áspera "o homem e o intelectual de nenhuma admissão metafísica, ancorado até ao final numa confiança arbitrária no materialismo histórico, aliás, marxismo".
SÉRGIO ALMEIDA